Autenticidade não se terceiriza

Juliana Negreti trocou os relatórios da auditoria por uma comunicação digital que traduz a essência da gastronomia. Hoje, comanda a MKT EATIN, agência focada em gastronomia, criada a partir da evolução do perfil @eatinsaopaulo

Por Miguel El Debs*

Conheci a Juliana pelo Gabriel Fagundes, da agência Hutte. Ele me apresentou o trabalho que ela estava fazendo no Instagram. Mais tarde, vi que o que ela fazia ia muito além da superfície das postagens – um hobby que virou uma forma autêntica de empreender com sabor e coerência. Tinha ali uma visão, uma consistência e, principalmente, uma escuta real do que a gastronomia representa para quem vive o bastidor.

A história dela começa muito antes da agência. “Eu morava em Ribeirão e fiz faculdade lá. Antes de acabar, fui morar na Austrália para melhorar o inglês. Trabalhei de faxineira, limpava a Johnson & Johnson à noite, fazia eventos, entregava panfleto, pista de gelo, tudo que você imaginar. Não era boa de bandeja, então garçonete não rolava”. E quando voltou ao Brasil, não queria ficar em Ribeirão.

“Comecei a procurar emprego fora e consegui na auditoria da Ernst & Young. Pagavam muito pouco, mas queria a experiência. Meus pais me ajudaram no começo, mas eu não gostava de ficar pedindo dinheiro. Dividi apartamento com meninas que conheci por grupo de Facebook. Não conhecia muita gente, não queria sair sozinha para jantar. Nem tinha iFood, acredita?! Só baixei na pandemia. Até então, jantava biscoito de polvilho. Pegava carona de BlaBlaCar com quem aparecesse. Essas coisas que a gente faz quando precisa se virar”.

Quando a coragem vira a chave

Formada em Economia e Contabilidade, Juliana passou oito anos no mundo corporativo, em empresas de auditoria. Nas horas vagas, saía para comer e produzir conteúdo. “Gastronomia era meu escape e meu momento de fazer o que eu realmente gostava”, conta. Foi nesse espaço entre prazer e produção que surgiu o perfil @eatinsaopaulo, que hoje se desmembrou nos perfis @MKT_EATIN, sua empresa de gestão de redes sociais para restaurantes, e o de dicas gastronômicas @juliananegreti.

A virada não foi de uma hora para outra, mas foi clara. Sua transição tem muito de intuição prática: ela foi construindo relações, aprendendo com os erros e esperando a oportunidade certa. Quando chegou, ela estava pronta. “Mesmo ganhando pouco, eu larguei tudo e me joguei, porque se a gente não concentra a energia em um objetivo, não dá certo”.

Inovar com os pés no chão

Hoje, a agência de Juliana atua em um mercado que vive um boom digital e também uma certa ilusão. “O mundo está virando para um lado de IA que tem que ser estudado, porque, além de custar caro, muitas vezes fica fake. E não é essa a expectativa que queremos criar para um cliente de restaurante que chegará e comerá de verdade”.

E a fala dela é correta: empreender no digital é, cada vez mais, sobre gerar valor autêntico. E isso exige olhar atento e postura firme. “Nem sempre atender a todas as demandas do cliente é viável ou estratégico. Entender as necessidades reais do público-alvo e alinhar isso aos objetivos do negócio é mais importante que ceder a qualquer pedido”.

Menos glamour, mais verdade

Para quem acha que empreender é glamour, ela avisa: “A imagem romantizada de empreendedores vivendo uma vida de luxo ignora o trabalho árduo, as incertezas e os desafios diários”. Por isso, seu conselho para quem está começando é direto:

“Tenha calma, seja autêntico, faça tudo direitinho, escute as pessoas envolvidas e tudo dará certo. Se não deu assim, não era pra ser. Próximo!”

A Juliana me lembra que empreender é ter coragem de mudar, mesmo quando o caminho parece estável. Isso foi também parte da minha conversa com Fernando Paiva, do Grupo Heads, você pode ler aqui.

É reconhecer um chamado interno e dar a ele o espaço de virar ofício. E, acima de tudo, é se posicionar com verdade num mercado cheio de filtros.

Se você conhece uma história que também merece ser contada, me escreve: 📩 contato@grupozumm.com.br

* Miguel El Debs, sócio do Grupo ZK, conselheiro estratégico de empresas de pequeno e médio porte e head do LIDE Empreendedor | Ribeirão Preto

Leia também:

Empreender sem rota: como um ciclista levou o cicloturismo para a Amazônia