Um dos estudos ainda aponta o uso excessivo de medicamentos no tratamento do TDAH e defende um cuidado com intervenções psicossociais
A 1ª vez que o TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade) apareceu documentado foi em um texto médico holandês datado de 1753. De lá para cá, o transtorno foi sendo cada vez mais estudado e diagnosticado.
Segundo dados da ABDA (Associação Brasileira de Déficit de Atenção), cerca de 2 milhões de pessoas sofrem com o transtorno no Brasil. E, nos últimos anos, o aumento o número de casos levantou uma série de dúvidas sobre as possíveis razões desse crescimento, sendo que, algumas pessoas, inclusive, começaram a questionar a existência da condição ou sua banalização.
“Realizamos uma pesquisa na USP em 2022 e, ao avaliarmos 43 crianças com diagnóstico médico de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, apenas três preencheram os critérios para TDAH ao serem submetidas a escalas específicas”, conta Anaísa Leal Barbosa Abrahão, doutora em Psicologia pela FFCLRP (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto) da USP.
Tal pesquisa ainda indicou um uso generalizado de metilfenidato, um dos principais medicamentos usados no tratamento do TDAH. “Dos 43 participantes, a maioria fazia uso desse medicamento, sem apresentar melhorias significativas nos sintomas principais do transtorno ou nos problemas de comportamento relatados por familiares e professores”.
Por isso, ela sugere uma abordagem mais abrangente no tratamento do transtorno, incluindo intervenções psicossociais, em vez de depender exclusivamente de tratamento farmacológico.
O TDAH
A doutora em Psicologia explica que o TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento, caracterizado por níveis prejudiciais de desatenção, desorganização, hiperatividade e impulsividade, que afeta diversas áreas da vida. A especialista ressalta que seu início é geralmente na infância, mas pode persistir até a vida adulta.
De acordo com a especialista, apesar das características, ainda não existe um consenso definitivo sobre a origem do TDAH. “Alguns estudos sugerem que fatores tanto ambientais quanto genéticos podem contribuir para o desenvolvimento do transtorno”, explica, acrescentando que o TDAH não possui um marcador biológico específico e, embora certos genes possam estar correlacionados, não são considerados determinantes por si só.
Também aparecem relacionados ao TDAH fatores ambienteis como prematuridade, exposição intrauterina a substâncias como tabaco, álcool e drogas, baixo peso ao nascer, problemas psicológicos maternos durante a gestação, complicações perinatais e lesões cerebrais.
Três tipos de transtorno
A neurologista Alicia Coraspe, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, fala sobre os três tipos de TDAH existentes: hiperativo/impulsivo, desatento e misto/combinado.
“No caso de pessoas com TDAH hiperativo/impulsivo, elas costumam ser inquietas, falam muito e interrompem constantemente. Já as pessoas com TDAH do tipo desatento cometem erros por falta de atenção e apresentam dificuldade para organizar tarefas e atividades”, detalha a especialista. Já o tipo misto/combinado, conforme o nome indica, mistura sintomas de desatenção com hiperatividade e impulsividade.
Segundo a neurologista, na infância, o transtorno geralmente se apresenta de forma combinada, com características de hiperatividade e desatenção. Mas, na idade adulta, o tipo mais predominante é o de desatenção. “Compreender os sintomas do TDAH e suas variações ao longo das diferentes faixas etárias é fundamental para um diagnóstico preciso e menos estigmatizado”, enfatiza.
Alicia ainda alerta que o diagnóstico de TDAH na infância requer um olhar treinado para distinguir comportamentos típicos da idade daqueles característicos do transtorno. “As mudanças no estilo de vida, como o aumento do uso de telas e conteúdos digitais mais curtos, juntamente com a rotina agitada dos pais que têm menos tempo para os filhos, têm levado mais famílias a consultórios médicos questionando a possibilidade desse diagnóstico”, afirma.
No entanto, de acordo com Alicia, muitas vezes o diagnóstico de TDAH não se concretiza, sugerindo uma possível supervalorização de sintomas comportamentais que podem ser normais para a faixa etária ou reflexos do ambiente moderno.
A neurologista concorda que o tratamento do TDAH deve ser muito mais do que as medicações psicoestimulantes. “Um boa noite de sono, bons hábitos, cronogramas e uma rotina bem estruturada, na verdade é o que muda a vida do paciente”.
E as especialistas não estão sozinhas na opinião: o Conselho Federal de Psicologia, juntamente com outros órgãos e países, está promovendo a campanha “Não à Medicalização da Vida”, que discute os perigos associados à medicalização excessiva de crianças e adolescentes.
A iniciativa também se preocupa com a identificação das crianças com TDAH, que pode resultar em estigmas e responsabilização injusta das pessoas por suas dificuldades.
* Com informações do Jornal da USP, em matéria de Julia Valeri
Pesquisas revelam diagnósticos equivocados de TDAH em crianças
Um dos estudos ainda aponta o uso excessivo de medicamentos no tratamento do TDAH e defende um cuidado com intervenções psicossociais
A 1ª vez que o TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade) apareceu documentado foi em um texto médico holandês datado de 1753. De lá para cá, o transtorno foi sendo cada vez mais estudado e diagnosticado.
Segundo dados da ABDA (Associação Brasileira de Déficit de Atenção), cerca de 2 milhões de pessoas sofrem com o transtorno no Brasil. E, nos últimos anos, o aumento o número de casos levantou uma série de dúvidas sobre as possíveis razões desse crescimento, sendo que, algumas pessoas, inclusive, começaram a questionar a existência da condição ou sua banalização.
“Realizamos uma pesquisa na USP em 2022 e, ao avaliarmos 43 crianças com diagnóstico médico de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, apenas três preencheram os critérios para TDAH ao serem submetidas a escalas específicas”, conta Anaísa Leal Barbosa Abrahão, doutora em Psicologia pela FFCLRP (Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto) da USP.
Tal pesquisa ainda indicou um uso generalizado de metilfenidato, um dos principais medicamentos usados no tratamento do TDAH. “Dos 43 participantes, a maioria fazia uso desse medicamento, sem apresentar melhorias significativas nos sintomas principais do transtorno ou nos problemas de comportamento relatados por familiares e professores”.
Por isso, ela sugere uma abordagem mais abrangente no tratamento do transtorno, incluindo intervenções psicossociais, em vez de depender exclusivamente de tratamento farmacológico.
O TDAH
A doutora em Psicologia explica que o TDAH é um transtorno do neurodesenvolvimento, caracterizado por níveis prejudiciais de desatenção, desorganização, hiperatividade e impulsividade, que afeta diversas áreas da vida. A especialista ressalta que seu início é geralmente na infância, mas pode persistir até a vida adulta.
De acordo com a especialista, apesar das características, ainda não existe um consenso definitivo sobre a origem do TDAH. “Alguns estudos sugerem que fatores tanto ambientais quanto genéticos podem contribuir para o desenvolvimento do transtorno”, explica, acrescentando que o TDAH não possui um marcador biológico específico e, embora certos genes possam estar correlacionados, não são considerados determinantes por si só.
Também aparecem relacionados ao TDAH fatores ambienteis como prematuridade, exposição intrauterina a substâncias como tabaco, álcool e drogas, baixo peso ao nascer, problemas psicológicos maternos durante a gestação, complicações perinatais e lesões cerebrais.
Três tipos de transtorno
A neurologista Alicia Coraspe, do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, fala sobre os três tipos de TDAH existentes: hiperativo/impulsivo, desatento e misto/combinado.
“No caso de pessoas com TDAH hiperativo/impulsivo, elas costumam ser inquietas, falam muito e interrompem constantemente. Já as pessoas com TDAH do tipo desatento cometem erros por falta de atenção e apresentam dificuldade para organizar tarefas e atividades”, detalha a especialista. Já o tipo misto/combinado, conforme o nome indica, mistura sintomas de desatenção com hiperatividade e impulsividade.
Segundo a neurologista, na infância, o transtorno geralmente se apresenta de forma combinada, com características de hiperatividade e desatenção. Mas, na idade adulta, o tipo mais predominante é o de desatenção. “Compreender os sintomas do TDAH e suas variações ao longo das diferentes faixas etárias é fundamental para um diagnóstico preciso e menos estigmatizado”, enfatiza.
Alicia ainda alerta que o diagnóstico de TDAH na infância requer um olhar treinado para distinguir comportamentos típicos da idade daqueles característicos do transtorno. “As mudanças no estilo de vida, como o aumento do uso de telas e conteúdos digitais mais curtos, juntamente com a rotina agitada dos pais que têm menos tempo para os filhos, têm levado mais famílias a consultórios médicos questionando a possibilidade desse diagnóstico”, afirma.
No entanto, de acordo com Alicia, muitas vezes o diagnóstico de TDAH não se concretiza, sugerindo uma possível supervalorização de sintomas comportamentais que podem ser normais para a faixa etária ou reflexos do ambiente moderno.
A neurologista concorda que o tratamento do TDAH deve ser muito mais do que as medicações psicoestimulantes. “Um boa noite de sono, bons hábitos, cronogramas e uma rotina bem estruturada, na verdade é o que muda a vida do paciente”.
E as especialistas não estão sozinhas na opinião: o Conselho Federal de Psicologia, juntamente com outros órgãos e países, está promovendo a campanha “Não à Medicalização da Vida”, que discute os perigos associados à medicalização excessiva de crianças e adolescentes.
A iniciativa também se preocupa com a identificação das crianças com TDAH, que pode resultar em estigmas e responsabilização injusta das pessoas por suas dificuldades.
* Com informações do Jornal da USP, em matéria de Julia Valeri
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